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CRIMINALIZAÇÃO DO RACISMO E DA INJÚRIA RACIAL

uma iniciativa do GRUPO DE AÇÃO CONJUNTA CONTRA O RACISMO E A XENOFOBIA

No dia 21 de março de 2024, Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial, o Grupo de Ação Conjunta Contra o Racismo e a Xenofobia, dá início à recolha de contributos escritos, para apresentar à Assembleia da República, uma Iniciativa Legislativa de Cidadãos, no sentido de ser aprovado um quadro legal que possa adequar o regime jurídico atual, à realidade portuguesa.

O Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação 2021-2025, publicado em julho de 2021, reconhece que, não obstante a legislação em vigor, “continuam a registar-se fenómenos de racismo e de discriminação que violam direitos fundamentais consagrados na Constituição da República Portuguesa”. Assume-se que o combate ao racismo e à discriminação racial e étnica é, “um desafio premente na sociedade portuguesa, vincado em todo o acervo legal existente e também nos vários compromissos nacionais e internacionais assumidos”.

O Plano “reconhece o trabalho que diversas entidades da sociedade civil, têm emprestado aos objetivos do mesmo, nas últimas décadas, sendo fundamentais a presença e as iniciativas mobilizadas pelas associações antirracistas e pela vitalidade da sociedade civil nas áreas da prevenção e do combate à discriminação.”

Sendo o objetivo do Grupo de Ação Conjunta Contra o Racismo e a Xenofobia, composto por mais de setenta coletivos, o combate ao racismo, à xenofobia e ao fascismo, combatendo todas as opressões e formas de discriminação, mostra-se necessário, pertinente e urgente, apresentar à Assembleia da República, uma iniciativa da sociedade civil para que nenhuma ação racista ou xenófoba, fique por investigar, fique por acusar, fique por condenar, por falta de base legal.

O arquivamento de queixas pela Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial e por parte dos diversos operadores judiciários, com a consequente reduzida taxa de sanções aplicadas, resulta claramente, em nosso entender, em primeiro lugar, da inoperância do quadro jurídico em vigor.

A maior parte dos factos praticados com motivação racista e xenófoba, quando dão origem a queixas, são tratados como processos de contraordenação, que podem resultar na aplicação de uma coima de montante bastante reduzido, tendo em conta a gravidade das ações que atentem de forma grave contra a vida e a dignidade das vítimas. Além do mais, muitos processos acabam por prescrever ou são arquivados por falta de provas pela ineficácia do sistema judicial.

O regime jurídico atual não serve o seu propósito, e por essa razão, o Grupo de Ação Conjunta Contra o Racismo e a Xenofobia, propõe nesta data, uma reflexão séria sobre possíveis alterações legislativas, num apelo à sociedade civil, para recolha de contributos sobre a melhor forma de intervir junto da Assembleia da República no âmbito de uma Iniciativa Legislativa de Cidadãos que se pretende vir a apresentar no mês de junho.

Poderão ser enviados contributos até ao dia 25 de abril. O formulário será disponibilizado no dia 21 de Março aqui: https://www.antiracismo.org/criminalizar-racismo

Respostas dos Partidos – Legislativas 2024

Conforme anunciado no passado dia 21 de fevereiro, o SOs Racismo solicitou aos partidos democráticos candidatos às próximas eleições legislativas que remetessem as suas propostas na área da inclusão social e combate ao racismo e xenofobia.

Até à presente data, foram recebidas as respostas que se colocam aqui.

Propostas do SOS RACISMO – Legislativas 2024

É com um compromisso inabalável para com a construção de uma sociedade justa, inclusiva e livre de discriminação que o SOS Racismo se dirige aos partidos políticos portugueses

Em antecipação às próximas eleições legislativas, apresentamos propostas fundamentais para a promoção de uma política anti-racista robusta em Portugal. Este documento serve como um apelo aos partidos que se candidatam às próximas eleições legislativas, para que adotem e implementem medidas concretas que combatam o racismo em Portugal.

Pretendemos também questionar o posicionamento dos partidos democráticos relativamente a organizações de extrema-direita, responsabilizando-os pelo seu posicionamento, levando em consideração a Constituição da República Portuguesa.

Da centralidade política trazida, nos últimos anos, pelo movimento social à questão racial, emanaram a Lei das Grandes Opções para 2023-2026, o Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação e a Estratégia Nacional para a Integração das Comunidades Ciganas e, em paralelo, os organismos para a sua concretização, implementação e fiscalização designadamente a Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial, o Observatório das Comunidades Ciganas – Observatório das Migrações, a Agência para a Integração, Migrações e Asilo, I. P. e o Observatório do Racismo e Xenofobia.

Sendo o Orçamento de Estado (OE) a tradução económica das opções políticas do governo, resulta necessário que as políticas públicas de combate às desigualdades com fator racial tenham maior definição, com a elaboração autonomizada de rubricas orçamentais exclusivamente dedicadas ao combate ao racismo, à xenofobia, à ciganofobia, ao anti-semitismo e à islamofobia. Nesse sentido, propõe-se que num primeiro horizonte de 10 anos, o OE consigne 1% das suas verbas para investimento em políticas públicas de combate à desigualdade racial. Este montante será declinado em rubricas orçamentais específicas nas áreas-chave da desigualdade racial como a Educação, acesso à Habitação, Saúde, Cultura e Lazer.

O SOS Racismo entende que para a eficácia das medidas preconizadas e das que propomos neste documento, bem como da arquitetura institucional desenhada, é necessário que se garantam as seguintes condições:

  • Recolha de dados étnico-raciais, para aferir as características da sociedade portuguesa, no que diz respeito à sua composição étnico-racial, ao exercício de direitos e ao acesso a bens e serviços essenciais.
  • Afetação de parcela do Orçamento de Estado ao financiamento das políticas públicas destinadas ao combate ao racismo e à inclusão social de minorias racializadas
  • Alteração do regime das entidades com competências específicas nestas matérias, atribuindo um estatuto inequívoco de Entidade Independente à Comissão para a Igualdade e retirando à AIMA – Agência para a Integração, Migrações e Asilo quaisquer competências que se relacionem com as comunidades ciganas, por tratar de questões de imigração.

Tendo por base estes pressupostos, o SOS Racismo propõe:

  1. Política Educativa

A educação, enquanto espaço de construção de um projeto de sociedade, não tem sido capaz de romper com as desigualdades estruturais com fator racial.

As seguintes propostas têm como finalidade repensar a escola em função das novas condições socioculturais, proceder a uma reparação que se impõe transversal e radical, no sentido da democratização do ensino, que se pretende de todos e para todos, independentemente da sua origem étnico-racial.

  • A descolonização dos programas e manuais escolares, feita em conformidade com a prévia descolonização dos programas e também ela acompanhada pelo olhar crítico de especialistas pertencentes a minorias étnico-raciais.
  • Promoção de um programa nacional de educação antirracista e para os direitos humanos envolvendo atividades curriculares, extra curriculares e de educação não-formal, que inclua formação inicial e contínua dos professores e do pessoal não-docente adequada à realidade intercultural do país.
  • Promoção de um debate transdisciplinar que desmonte as consequências do legado colonial e esclavagista na perpetuação do racismo estrutural na sociedade portuguesa, através das desigualdades das pessoas racializadas.
  • Promoção de narrativas transdisciplinares que reconheçam a diversidade da população portuguesa, incluindo referências à história das comunidades ciganas, tendo em conta os princípios e valores constitucionais, o referencial dos direitos humanos e a diversidade social e cultural do país.
  • Envolvimento das comunidades educativas no debate em torno dos problemas do racismo e xenofobia, com especial foco na promoção dos contributos das pessoas mais atingidas pelas consequências e efeitos dos problemas identificados.  
  • Introdução nos curricula escolares do ensino das diversas línguas maternas em presença nas diversas comunidades educativas.
  • Reconhecimento das associações de imigrantes como parte da comunidade educativa, e por isso com um papel decisivo na formação, ensino e educação.
  • Tomar medidas concretas para a erradicação do fosso de aprendizagem e aproveitamento escolar entre os alunos portugueses e os os alunos dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa, seja através de programas de apoio de ensino especial, seja através de outras práticas educativas que se possam criar.
  • Averiguação da existência da prática de estruturação de turmas de alunos consoante o nível económico, social e a pertença étnico-racial. Erradicação desta prática nas escolas onde for provada a sua existência.
  • Criação de programas de incentivo à frequência do Ensino regular pelas comunidades racializadas, desincentivando o encaminhamento preferencial para o ensino profissional/vocacional que promove a sub-representação de racializados no Ensino regular e sobre-representação no profissional/vocacional.
  •  Promover, através de quotas étnico-raciais, o acesso de afrodescendentes, pessoas ciganas/roma e outras pessoas racializadas à docência em todos os níveis do sistema de ensino e aos lugares  de produção e reprodução de conhecimento. 
  • Inclusão no plano nacional de leitura e no plano nacional de cinema de autores do sul global e pertencentes a minorias étnico-raciais.

2. Políticas Europeias

Os regulamentos que fazem parte do Pacto para as Migrações e Asilo terão ainda de ser votados na Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos (LIBE) do Parlamento Europeu e pelo hemiciclo.

Tendo em conta que este novo Pacto das Migrações é uma rutura total com todas as garantias da convenção de Genebra, na proteção dos direitos dos refugiados, migrantes e pessoas deslocadas, o SOS entende que Portugal pode e deve acionar o mecanismo de “opting out” no quadro das instituições europeias para aplicar um regime jurídico de proteção de direitos mais favorável. Portugal pode em alternativa escolher aplicar a Convenção Internacional da Proteção das Pessoas Migrantes e Suas Famílias, que estabelece melhores garantias dos direitos destas pessoas. 

O SOS Racismo condena a política externa da UE em matéria de migrações, sobretudo no que diz respeito aos protocolos de colaboração celebrados com países externos à UE, como a Turquia ou a Líbia, entre outros, com o objetivo de aí serem criados centros de detenção de imigrantes. Condenamos a atuação do Frontex e toda uma política de militarização securitária das fronteiras da UE, tornando as rotas de imigração muito mais arriscadas e perigosas, bem como a criminalização de organizações e ativistas que têm como propósito ajudar e salvar as pessoas que decidem migrar.

A UE deverá ser obrigada a reconhecer proteção e  asilo a todas as pessoas que, fruto do modelo económico extrativista e da catástrofe ambiental por si provocada, se veem obrigadas a procurar novos locais para viver. A categoria de refugiado climático é um imperativo ético.

3. Recolha de Dados Étnico-Raciais

O Inquérito às Condições de Vida, Origens e Trajetórias da População Residente em Portugal (ICOT) não contou com o envolvimento das organizações das comunidades racializadas e do movimento antirracista na sua conceção para que seja possível aprofundar o conhecimento sobre a discriminação étnico-racial em Portugal. 

O SOS entende que o Estado só poderá desenvolver e implementar políticas públicas eficazes e de qualidade se tiver ao seu dispor um quadro de informações reais sobre a situação e as condições de vulnerabilidade provocadas pela desigualdade racial. A recolha de dados étnico-raciais é o único mecanismo capaz de providenciar este conhecimento que permita uma elaboração transversal de políticas sectoriais de combate às desigualdades com fator racial. Foi nesse sentido que nas duas últimas legislaturas foram criados pelo governo dois grupos de trabalho para, além do diagnóstico, propor respostas concretas. Esses dois grupos de trabalho produziram relatórios com recomendações para o combate ao racismo. 

Assim, o SOS propõe que o Estado Português aplique na íntegra as recomendações dos Relatórios finais do Grupo de Trabalho Censos 2021 – Questões Étnico-Raciais, conforme Despacho n.º 7363/2018, 3 de agosto e do Grupo de Trabalho para a Prevenção e o Combate ao Racismo e à Discriminação, através do Despacho n.º 309-A/2021, 8 de janeiro.

4. Medidas de Ação Afirmativa

As medidas de ação afirmativa assentam nos princípios de igualdade, diversidade e inclusão preconizados na Constituição da República e constituem ferramentas vitais para a correção de desequilíbrios históricos e promoção da inclusão efetiva de comunidades marginalizadas.

O SOS considera que existem vários exemplos de políticas de ação afirmativa que podem ser implementadas para debelar desigualdades estruturais, nomeadamente programas sectoriais específicos de apoio no acesso à universidade (ex. quotas raciais do PROUNI no Brasil). Não defendemos a importação cega de modelos, mas consideramos que políticas de ação afirmativa mostraram resultados reais em diversos países e, como tal, deverão fazer parte do leque de medidas para combater desigualdades estruturais no acesso à educação, saúde, cultura, etc.

5. Criminalização do Racismo

O SOS propõe que o crime de prática racista enquadrado no regime contra-ordenacional, seja alterado, já que se trata de um ilícito considerado de menor gravidade, de mera ordenação social, em relação ao qual a moldura sancionatória está desfasada da realidade, pois as consequências da prática de atos racistas não são devidamente punidas. O racismo continua a ser encarado como uma opinião, uma questão isolada, mas não um problema estrutural ao qual deve ser conferida a máxima atenção, impondo limites às práticas racistas, sem nunca perder de vista que estamos perante matéria de direitos fundamentais constitucionalmente protegidos.

O SOS entende que é premente que sejam criminalizados todos os comportamentos ilícitos que estão contemplados como contra-ordenações, porque os bens jurídicos violados com práticas racistas (a dignidade das pessoas, a sua honra e consideração), para além da censura ética e política, merecem censura penal. 

Os dados disponíveis sobre o número de queixas e o número de condenações, deixam a descoberto a ineficácia do sistema legal e judicial para fazer face à realidade. Tudo isto contribui para o  descrédito em toda a estrutura de justiça, que, ao invés de proteger as vítimas e prevenir o aumento de ilícitos racistas e xenófobos, as deixa completamente desamparadas quando são alvo de atos racistas.

6. Alteração do Artigo 250.º do Código Penal

O SOS propõe a revisão urgente do artigo 250.º do Código de Processo Penal, retirando-lhe a possibilidade de identificação de pessoas sobre as quais haja fundadas suspeitas de entrada ou permanência irregular no território nacional.

Deve ser eliminada do n.º 1 do artigo 250.º do Código de Processo Penal, a frase “de que tenha penetrado ou permaneça irregularmente no território nacional” (o que constitui uma contraordenação e não uma infração criminal como parece resultar da inclusão desta situação no referido artigo), entre os motivos que legitimam a identificação de suspeitos pela polícia. É manifesto que as forças policiais têm utilizado esta norma para justificar intervenções ilegais e ilegítimas junto de pessoas e comunidades racializadas.

7. Carta de Princípios para a Administração Pública

Como preconiza a Constituição da República, o princípio da igualdade e da não discriminação é um dos valores cardinais do Estado de Direito Democrático. O serviço público deve, em todas as circunstâncias, assegurar a plenitude deste princípio no exercício das suas atribuições. Deste modo, a implementação de uma Carta de Princípios Antirracistas para Administração Pública foi uma das recomendações do Grupo de Trabalho para a Prevenção e o Combate ao Racismo e à Discriminação.

O SOS propõe a sua implementação conforme recomendações do relatório do grupo de trabalho.

8. Conclusão do Processo da Lei da Nacionalidade

O SOS propõe que a lei da nacionalidade garanta o reconhecimento automático da nacionalidade portuguesa a quem nasça em território português (implementação do princípio do Jus Soli) e que sejam ultrapassadas as falhas processuais que têm condicionado a sua aplicação.

O SOS entende, ainda, ser necessário que:

  • a concessão de nacionalidade seja estendida automaticamente ao cônjuge e aos descendentes menores, ou maiores que deles dependam, exceto por manifesta vontade em sentido contrário;
  • se elimine da lei o requisito da integração efetiva na comunidade portuguesa;
  • se consagre na lei, face a condenação em crime punível com pena de prisão igual ou superior a três anos, a jurisprudência recente do Supremo Tribunal Administrativo que reconhece o caráter ressocializador da pena, deixando de constituir impedimento assim que for apagada do registo criminal do requerente tal condenação.

9. Direito de Voto dos Imigrantes

Atualmente, centenas de milhares de imigrantes vivem em Portugal e, tal como os cidadãos e as cidadãs nacionais, são contribuintes ativos da Segurança Social e da Autoridade Tributária.

A grande maioria dos cidadãos imigrantes estão impedidos de exercer os seus direitos políticos, o que contraria o disposto no art.º 15.1 da Constituição da República Portuguesa que consagra que os cidadãos estrangeiros residentes gozam dos direitos e que estão sujeitos aos deveres do cidadão português.

Entendemos que este artigo deve ser entendido à luz do princípio constitucional da igualdade, advogando pelo exercício dos direitos políticos em todas as eleições (autárquicas, legislativas e presidenciais) a todos e a todas com base no estatuto de residência e não da nacionalidade, tal como vigora nos atuais acordos de reciprocidade assinados entre Portugal e alguns países não membros da União Europeia.

Para o SOS ser favorável ao Direito de voto para as e os estrangeiros não é um favor, é a concretização de um dos valores e princípios democráticos em que todos e todas possam exercer os seus direitos políticos em todas as eleições (locais, legislativas, europeias e presidenciais) nos locais onde residem e que possam exercer plenamente as suas capacidades eleitorais, activa e passiva.

10. Violência Policial e Sua Prevenção e Punição:

O SOS propõe:

  • Expulsão de agentes com processos transitados em julgado em que se tenham comprovado práticas racistas e discriminatórias. As forças policiais não podem premiar ou fomentar práticas racistas mantendo nos seus quadros agentes comprovadamente racistas;
  • Mecanismos de Monitorização e Fiscalização: Reformar a IGAI ou estabelecer órgãos independentes com orçamento próprio (“watchdogs”) para monitorizar e investigar queixas de discriminação e abuso policial, garantindo a responsabilização e transparência;
  • Desmilitarização da intervenção policial: não sendo os lugares ocupados por pessoas racializadas territórios de exceção jurídica, cumpre ao estado garantir que a manutenção da ordem pública nesses territórios é feita segundo os códigos e procedimentos aplicados em todo o país. Devem proibir-se as rusgas colectivas nesses territórios, as detenções arbitrárias e invasões domiciliárias sem mandato judicial;
  • Participação Comunitária: Desenvolver programas de policiamento comunitário que envolvam ativamente comunidades racializadas e comunidades de imigrantes no planeamento e implementação de estratégias de segurança local;
  • Justiça e Reparação às Vítimas: Garantir que as vítimas de violência policial recebam justiça e reparação adequadas;
  • Políticas de Não Discriminação: Criar e aplicar políticas adequadas que promovam a igualdade e a não discriminação dentro das forças policiais, incluindo diretrizes rigorosas contra o perfilamento racial e outras formas de discriminação;
  • Elaborar Relatório sobre Violência Policial: Criar plataforma de denúncias e recolha de relatos de violência policial. Relatório anual a ser produzido pelo Observatório do Racismo e da Xenofobia. 
  • Formação: Implementar programas de formação para as polícias focados na diversidade cultural, direitos humanos, comunicação intercultural e anti-racismo.

11. 25 de Abril e Políticas da Memória – Amílcar Cabral 

A memória é uma construção coletiva e política que resulta de uma negociação complexa e muitas vezes violenta – sobretudo para os grupos subalternizados – entre memorialização e apagamento. No que se refere à construção da memória cultural, em Portugal permanece por questionar uma visão lusocêntrica, colonialista e patriarcal da história, da vida pública e da identidade nacional. O SOS Racismo considera que é urgente desvelar os aspetos silenciados da história, proclamar o contributo das populações negras, ciganas e outras migrantes para o que Portugal é hoje e criar condições para que políticas de reparação histórica possam ser levadas a cabo. Além disso, desafiamos os partidos a integrarem nos seus programas medidas concretas para promover a inclusão e reconhecer as diversas contribuições culturais que enriquecem a sociedade portuguesa. 

À medida que nos aproximamos do 50º aniversário do 25 de Abril, sublinhamos a relevância de refletir sobre o papel crucial dos Movimentos de Libertação Africanos não só na resistência contra a opressão colonial, mas também na construção da democracia portuguesa.  O dever de cumprir a promessa de Abril torna-se mais premente do que nunca, não apenas para descolonizar, desracializar e democratizar, mas também para honrar o legado daqueles que lutaram pela liberdade e para preservar a memória da história que moldou o nosso país. Quanto mais plural, mais multifacetada e até contraditória em si mesma for a nossa memória coletiva, maior será a nossa capacidade, enquanto sociedade, de rejeitar o racismo, a xenofobia e o recrudescimento da extrema-direita. O SOS Racismo desafia ativamente os partidos políticos a enfrentarem as estruturas que perpetuam a discriminação e a construírem uma democracia inclusiva, ancorada numa memória coletiva plural, multicultural e complexa, como a própria vida.

Para este efeito – além das propostas sobre educação já feitas no primeiro ponto – o SOS considera fundamental:

  • O reconhecimento e inscrição da figura de Amílcar Cabral no espaço público como um dos fundadores da democracia em Portugal. Além do espaço que deve ser dado a esta figura incontornável do pensamento em língua portuguesa – reeditando obras, incluindo-as no plano Nacional de Leitura – é importante a edificação de um monumento em sua honra, num local privilegiado da capital portuguesa. Sugerimos ainda a construção de um centro interpretativo Amílcar Cabral, reunindo o espólio do pensador espalhado pelos vários arquivos nacionais e internacionais, de entre os quais se destaca o acervo da Fundação Mário Soares;
  • A implementação de um dia de memória a todas as vítimas de racismo e de xenofobia em Portugal. A proposta do dia concreto deve partir das comunidades racializadas, que devem ser consultadas pelo governo para o efeito;
  • A discussão na Assembleia da República sobre a memorialização das vítimas da escravatura e do colonialismo como um projeto abrangente a nível nacional. Uma tomada de posição oficial relativamente à falta de cumprimento por parte da Câmara Municipal de Lisboa do seu compromisso na construção do Memorial de Homenagem às Pessoas Escravizadas, um dos projetos mais votados no Orçamento Participativo do Município de Lisboa de 2017. Construção de um memorial com esta mesma função;
  • Dignificação dos restos mortais das 158 pessoas encontradas no Vale da Gafaria, em Lagos, hoje a cargo de uma empresa privada. A sua transladação e enterro, bem como a digna memorialização do local (hoje um parque de estacionamento com um mini-golfe no topo) como o mais antigo cemitério de pessoas escravizadas no mundo; 
  • Criação de uma comissão especializada para fazer o inventário, o mapeamento espacial e os devidos estudos de proveniência de todos os objetos africanos, sul americanos e asiáticos presentes em Portugal, adquiridos em contexto colonial.  Instituir uma plataforma oficial de encontros para troca de ideias sobre restituições e responsabilidades coletivas com a participação ativa das comunidades;
  • Restituição rápida e acompanhada de pedido de desculpas dos objetos, arquivos, artefactos e corpos humanos presentes nas instituições de cariz museológico, que venham a ser reclamadas pelas comunidades colonizadas. Disponibilização de recursos financeiros e outros, de acordo com as demandas dessas comunidades, no apoio às infraestruturas para receber e ativar objetos, arquivos, obras.

12. Apoio a Organizações Anti-Racistas 

Tendo em conta que a intervenção das organizações antirracistas tem um caráter de utilidade pública, podem e devem ser apoiadas com meios materiais e financeiros. O Estado deverá assegurar a desburocratização e a transparência dos processos de acesso a fundos para realização de atividades. 

Diante da urgência em promover uma transformação significativa naquilo que são as nossas políticas anti-racistas e de inclusão de todas as pessoas independentemente da sua origem ética e/ou nacional, o SOS Racismo insta os partidos políticos em Portugal a considerarem atentamente as propostas apresentadas neste documento. 

Convidamos cada partido a expressar sua posição e compromisso com a implementação destas medidas. Desafiamos ainda os representantes políticos no parlamento a integrarem estas propostas nos seus programas, demonstrando assim um compromisso tangível com a construção de um Portugal inclusivo, justo e democrático para todos e todas aqueles que aqui residem.

Neste sentido, solicitamos a vossa resposta às nossas propostas, no prazo de 5 dias, para que as possamos divulgar ainda durante a campanha eleitoral.

21 de fevereiro de 2024

Movimento SOS RACISMO

Violência contra anti-fascistas: CML e PSP cedem à extrema-direita

Anunciada para dia 3 de Fevereiro, a manifestação racista, islamofóbica e fascista que pretendia, sob o mote “Contra a islamização da Europa” marchar pela rua do Benformoso, Martim Moniz e rua da Palma, foi proibida pelo tribunal administrativo do círculo de Lisboa de o fazer, confirmando a decisão inicial da CML da não realização dessa acção, depois da apresentação de uma queixa-crime entregue pelo SOS Racismo no DCIAP de Lisboa (Ministério Público) e, sobretudo, pela pressão da denúncia da carta aberta “Contra o Racismo e a Xenofobia, recusamos o silêncio”, que teve 8,264 assinaturas individuais e 210 associações e vários coletivos. Quase10,000 vozes exigindo actuação ao abrigo da Constituição da Republica Portuguesa, denunciando a prática do crime de discurso de ódio.

No dia 3 de Fevereiro o grupo 1143 de extrema-direita realizou, num local diferente ao inicialmente definido, ao abrigo de permissão camarária e da PSP, o seu desfile de ódio. Permitiu o CML que neonazis e neofascistas descessem do Largo Camões até à Praça do Município empunhando tochas, bandeiras, entoando o hino nacional acompanhado da saudação nazi e louvores salazaristas. A CML permitiu assim, 29 anos depois do brutal assassinato de Alcindo Monteiro na Rua Garrett por um grupo de neonazis e neofascistas do qual Mário Machado fazia parte, que o mesmo com o seu grupo voltasse a marchar pela mesma rua, entoando cânticos de ódio, marchando sob proteção policial. Para a CML, a ilegalidade depende das coordenadas apresentadas pelos responsáveis da convocatória, e não pelo teor da manifestação, onde o crime de discriminação e incitamento ao ódio e à violência, previsto no artigo 240o do Código Penal, seriam, e foram, cometidos.

Até à data, nenhuma entidade a quem foi dirigida a carta aberta “Contra o Racismo e a Xenofobia, recusamos o silêncio” se pronunciou, e o seu silêncio torna-se cúmplice de um crime cometido com o aval da CML.
Dia 3, contrariando a intenção fascista e racista anunciada, milhares de pessoas concentraram-se no Intendente, celebrando a interculturalidade e a diversidade, contra o racismo e a xenofobia. Diversos colectivos e organizações da sociedade civil ocuparam o espaço devolvendo as ruas à liberdade, sob o lema “Não passarão!”.

Um grupo de activistas antifascistas e antiracistas deslocou-se até à Praça do Município contestando a manifestação fascista e racista (que a ONG GPAHE já concluiu ter no seu meio apoiantes do Chega), ocupando o espaço destinado ao final da marcha nazi, com o mote “As únicas pessoas que não são bem-vindas aqui, são os fascistas”. Segundo jornalistas que estavam no local, sem qualquer aviso prévio para dispersar, a polícia de intervenção rápida recorreu à força e a gás pimenta sob as e os manifestantes que, pacificamente, protestavam e contestavam o espaço público. Além dos activistas, dois jornalistas em exercício de funções foram espancados, empurrados e pontapeados, bem como turistas e outros transeuntes que assistiam ou passavam na Rua do Arsenal, resultando em 4 feridos com gravidade e dois detidos. Um dos detidos, já imobilizado no chão, foi agredido com duas cacetadas nas costas. Os elementos da polícia de intervenção rápida, contrariamente à obrigatoriedade legal e recomendação da Inspeção-Geral da Administração Interna, não exibiam nenhum elemento de identificação visível e frontal, com o nome ou número.

O SOS Racismo repudia a atuação da CML, por profundo incumprimento do Código Penal e da Constituição da República Portuguesa, no ano em que se comemora 50 anos de Abril. 50 anos depois, as ruas, a Liberdade, volta a estar comprometida, com o silêncio de todas as autoridade e de todo o sistema estatal.

Num gesto que evocou as sombrias procissões do Ku Klux Klan, o grupo de extrema- direita 1143 desfilou pelas ruas de Lisboa, numa marcha que relembrou tragicamente os linchamentos até à morte ocorridos no passado, celebrando de forma macabra a tragédia de 1995. Esta ação não só desrespeita a memória das vítimas como ignora os princípios de humanidade e justiça. Condenamos veementemente a violência perpetrada e repudiamos a atuação da Polícia de Segurança Pública (PSP), que, ao invés de proteger, agiu com desmedida brutalidade contra manifestantes pacíficos. Exigimos que a tutela e a Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI) realizem um rigoroso apuramento das responsabilidades criminais dos agentes que atuaram de forma ilegal, assegurando que a justiça prevaleça e que tais atos não se repitam, em respeito à lei e aos direitos fundamentais.

NOTA – emitimos o presente comunicado no mesmo dia em que Mário Machado é presente em tribunal, acusado de discriminação e incitamento ao ódio e à violência contra mulheres de esquerda.

NÃO PASSARÃO!

Comunicado SOS Racismo – Queixa Crime

O SOS Racismo apresentou ontem, no Ministério Público, uma queixa crime contra as pessoas responsáveis pela convocatória de uma manifestação/marcha em Lisboa, denominada “Manifestação Contra a Islamização da Europa”, marcada para o dia 3 de fevereiro de 2024, em Lisboa.

A referida convocatória e manifestação servem unicamente para expressar discursos de ódio, generalizações, preconceitos e afirmações ostensivamente falsas, injuriosas e difamatórias sobre um conjunto de pessoas, em função apenas da sua nacionalidade, origem, religião e cultura, e apelam, diretamente, à violência dirigida às comunidades imigrantes que residem ou trabalham em Portugal.

O SOS Racismo entende que os responsáveis por esta convocatória cometeram os crimes de discriminação e incitamento o ódio e à violência, previstos no artigo 240º do Código Penal, e apela ao Ministério Público que proceda às diligências necessárias para que o mesmos sejam levados a julgamento.

O SOS Racismo apela ainda às autoridades competentes que não permitam que tal marcha venha a ocorrer – desde o Ministério da Administração Interna, ao Ministério Público e à Câmara Municipal de Lisboa, todas estas entidades têm atribuições e competências específicas nestas matérias, cabendo-lhes defender os direitos fundamentais das pessoas visadas nestes atos de violência.

Por fim, convidamos todos e todas que não aceitam viver numa sociedade racista e xenófoba a comparecer no Intendente, em Lisboa, no próximo dia 3 de fevereiro, a partir das 16h, para afirmar a nossa solidariedade com as comunidades imigrantes que ali residem e trabalham.

Não passarão!

Lisboa, 26 de janeiro de 2024 

Execução racista em Setúbal: SOS Racismo Exige Ação Imediata Contra o Ódio

Segundo informação expressa nos meios de comunicação, um imigrante indiano foi vítima de um ato de violência extrema em Setúbal, na Rua Engenheiro Ribeiro da Silva, nas Praias do Sado, que culminou na sua execução. A Polícia Judiciária de Setúbal, segundo as mesmas fontes, deteve dois irmãos, de 22 e 29 anos, pelo homicídio de Shahil Gurpreet Singh, jovem de 25 anos, no dia 5 de Novembro. Os dois suspeitos de nacionalidade portuguesa tentaram matar todos os seis ocupantes da casa por motivação racista. Nesse domingo, Gurpreet Singh, estava no seu quarto quando foi assassinado com um tiro de caçadeira no peito disparado através de uma janela. Outra pessoa, de 33 anos, foi atingida num ombro – a Polícia Judiciária acredita que o objetivo dos criminosos era atingir todos os moradores.

Expressamos a nossa mais veemente condenação a este ato hediondo. O SOS Racismo repudia qualquer forma de discriminação e apela à sociedade para que se una na condenação deste crime de ódio. A perda de uma vida humana em circunstâncias tão cruéis é inaceitável e representa um ataque não apenas à vítima e à sua família, mas também a todos os pilares por que se deve pautar a nossa sociedade.

Instamos as autoridades competentes a conduzirem uma investigação rigorosa e célere para identificar e responsabilizar os autores deste ato criminoso. Oferecemos o nosso apoio e solidariedade à comunidade indiana, e apelamos a um reforço das medidas de combate ao racismo, promovendo a educação e sensibilização para a diversidade cultural.

Este crime é um aviso sombrio de que a luta contra o racismo é urgente e não pode parar. O SOS Racismo permanece comprometido em promover uma sociedade justa e inclusiva, onde todos os indivíduos possam viver livres de discriminação e violência.

SOS RACISMO
18 Dezembro 2023

Posição do Movimento SOS RACISMO face ao desfecho do julgamento de Mamadou Ba

Perante a decisão do tribunal em acompanhar a vontade de um confesso neonazi, o Movimento SOS Racismo reitera a sua solidariedade com Mamadou Ba. e denuncia a perseguição política de que tem sido alvo e, através dele, o próprio antirracismo.

O SOS Racismo recusa os intentosmanifestos ou ocultos, de equiparar o antirracismo ao racismo, o que não passa de um estratagema de banalizar e normalizar o racismo.
Tem sido patente na sociedade uma vontade de adoptar posturas contra o antirracismo que pretendem silenciar as vozes que lutam pela democracia. Infelizmente essa postura tem adquirido contornos estruturais, que se torna particularmente grave quando é reproduzida pelas instituições ligadas à justiça.

Somos por isso pela defesa de uma justiça impermeável a este tipo de cumplicidade e que se comprometa antes em combater o Racismo Estrutural que afeta as instituições que regem a vida das pessoas e com quem elas têm de lidar diariamente para fazer valer os seus direitos.

Lamentamos ainda a manipulação pelos meios de comunicação, no tratamento deste e de outros casos, com efeitos de lavagem da imagem do Racismo e da Extrema Direita, e dos seus atores mais reconhecidos.

É importante não esquecer que Mário Machado foi dos poucos envolvidos na violência do dia 10 de junho de ’95 que nunca demonstrou qualquer arrependimento e que continua militantemente envolvido em movimentos de ideologia de extrema-direita.

Perante o desfecho da leitura da sentença hoje proferida, que acreditamos contrariar todas as instâncias onde foram julgadas todas as pessoas envolvidas na “caça ao preto” do dia 10 de Junho de 1995, vimos exprimir o nosso apoio incondicional a qualquer decisão que o Mamadou Ba venha a tomar.

Continuamos mobilizados para, em conjunto com todos e todas que lutam pela democracia, construir uma sociedade justa e igualitária.

20 de outubro de 2023